O que há de melhor além dos antidepressivos?

O que há de melhor além dos antidepressivos?

30 de abril de 2021

Background

  • Os ISRS são a primeira linha na terapia da depressão e transtornos de ansiedade.
  • A psilocibina possui propriedades antidepressivas estudadas desde metade do século XX.
  • Evidências mais robustas precisam ser coletadas para garantir resultados confiáveis.

Depressão e farmacoterapia

A depressão é um transtorno de humor que afeta aproximadamente 322 milhões de pessoas no mundo todo (Dados da Organização Mundial de Saúde até o ano de 2015). No Brasil, mais de 11,5 milhões de pessoas convivem com a doença, o que representa 5,8% da população. Ainda, mais de 18,6 milhões de pessoas (9,3% da população brasileira) têm distúrbios relacionados à ansiedade. Essas doenças afetam a vida pessoal e econômica dos indivíduos acometidos, além de acarretar custos à sociedade.
Os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), como a fluoxetina, sertralina, escitalopram, são os medicamentos de primeira linha para o tratamento da depressão. No entanto, o início do tratamento com esses medicamentos demanda resiliência e persistência dos pacientes, pois estas substâncias levam entre 15-21 dias para início do efeitos benéficos, e em muitos casos, os pacientes podem ser refratários aos tratamentos disponíveis.
Robin Carhart-Harris e colaboradores (2021), realizaram um ensaio clínico de fase 2, duplo-cego, randomizado, comparando os efeitos antidepressivos do escitalopram, um ISRS com excelente perfil de segurança e eficácia, com a psilocibina, um composto psicodélico. A psilocibina é um composto psicoativo natural, extraído de cogumelos.
Como a grande maioria das substâncias psicodélicas, os efeitos da psilocibina acontecem pela sua atividade agonista sobre os receptores 5-HT2A da serotonina. Esse receptor está também relacionado com a depressão.  Nesse sentido, na metade do século XX, pesquisadores já começaram a vislumbrar o uso dela como adjuvante na farmacoterapia nos transtornos de humor e no tratamento da dependência química.
Alguns estudos já foram realizados para avaliar o papel da psilocibina no tratamento da depressão e ansiedade.  Os resultados demonstraram que após a administração de 2 ou 3 doses dessa substância os sintomas depressivos dos pacientes reduziram. Nesse estudo de Carhart-Harris, eles avaliaram pacientes, homens e mulheres entre 18-80 anos, com histórico de longos anos convivendo com a depressão na sua forma moderada ou grave, tratados com escitalopram ou psilocibina durante 6 semanas.
Os pesquisadores utilizaram o QIDS-SR16 (Inventário Rápido de Sintomatologia Depressiva), um questionário para avaliar os sintomas dos pacientes com transtorno depressivo numa escala de 1-27, podendo ser, simplistamente, interpretado da seguinte forma:
1-5: sem sintomas depressivos
6-10: depressão leve
11-15: depressão moderada
16-20: depressão grave
21-27: depressão muito grave, com ideação suicida

No início do estudo, os pacientes responderam a esse questionário, sendo o score do grupo psilocibina de 14,5 e do grupo escitalopram 16,4.  No final das 6 semanas, os pesquisadores observaram uma redução de 8 pontos no score dos pacientes que receberam a psilocina, e de 6 pontos nos pacientes tratados com escitalopram. Através do QIDS-SR16, foi possível observar remissão dos sintomas em 57% dos pacientes do grupo tratado com psilocibina, e em 28% dos pacientes tratados com escitalopram.  Um ponto importante a destacar é que, a incidência de efeitos adversos foi parecida entre os dois grupos.
Baseado nesses dados e na interpretação do QIDS-SR16 após 6 semanas, as informações não são suficientes para mostrar um efeito antidepressivo superior da psilocibina em relação ao escitalopram. Por isso, estudos mais longos e maiores, que avaliem um número maior de pacientes são necessários para comparar os efeitos antidepressivos da psilocibina com o dos demais ISRS.
Respondendo a pergunta do título, ainda nada!
REFERÊNCIAS: 1.CARHART-HARRIS, R., et al. Trial of psilocybin versus escitalopram for depression. The New England Journal of Medicine, 348, 1402-1411, 2021. 2. RUSH, A.J., et al. The 16-Item quick inventory of depressive symptomatology (QIDS), clinician rating (QIDS-C), and self-report (QIDS-SR): a psychometric evaluation in patients with chronic major depression. Biological Psychiatry, 54, 573-583, 2003. 3. Organização Pan-Americana de Saúde.

Evolução dos sintomas e do bem-estar dos pacientes ao longo das 6 semanas do ensaio clínico (CARHART-HARRIS, et al., 2021).

Marissa G. Schamne
Marissa G. Schamne
PhD | Cientista

Pesquisadora e professora universitária, farmacêutica por formação. Despertou o interesse pela pesquisa durante a faculdade na Iniciação Científica, que obviamente foi na área da neuropsicofarmacologia. Concluída a graduação, segue o caminho da carreira acadêmica e pesquisa até a co-fundação do Rigor Científico – onde encontrou uma maneira de expressar todo seu amor pela Ciência, e vislumbra a possibilidade de levar essas informações ao maior número possível de pessoas. Era uma pessoa tímida que conforme foi se inserindo no meio acadêmico encontrou uma forma de libertar-se dessa timidez, e agora matraqueia sem parar. Apaixonada pela natureza, esportes ao ar livre e a sensação de liberdade que isso traz. Gosta de viajar pelo mundo, seja através dos livros que lê ou das viagens que faz. Almeja alçar vôos mais altos divulgando ciência por aí.

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